A primeira coisa que aprendemos sobre o corpo humano são as suas partes: cabeça, tronco e membros. Uma corporação pode também ser assim configurada. Na área de Saúde, o primeiro sinal da Desgovernança Corporativa (DC) aparece quando o principal acionista um dia percebe que a empresa só tem membros. A cabeça e o troco ficaram pelo caminho. Não importa se esse é um fenômeno circunstancial na organização, o desgoverno escancara quando pernas e braços até se movimentam com agilidade, mas para lugar nenhum. A corporação cresce e até encontra lucro em seus balanços, mas ninguém dentro dela, ou mesmo fora, sabe para onde ela está indo.
A desgovernança possui uma hipocrisia básica: todos os membros aparecem na foto como satisfeitos com os resultados, embora desconfiem aqui e ali de que algo está errado. Nos hospitais, por exemplo, símbolo inequívoco da dificuldade gerencial, é usual a cúpula-acionista se reunir todo mês e despachar decisões, diretrizes e orientações para a melhoria da gestão. Todavia, ao longo do tempo, parece que nada acontece. Os membros (funcionários, médicos, diretores, gerentes, etc.) sempre têm uma explicação plausível para as erranças e procrastinações. Um sintoma claro de DC no gerenciamento hospitalar é a identificação de que por maiores que sejam os erros não existem culpados. Não é que “ninguém tem razão”, o problema é que “todos a têm”. Existe sempre uma justificativa (e muitas vezes real) para a ciranda de problemas. Como a cabeça está “acéfala”, todos aceitam esse ecumenismo destruidor como um fato natural.

O texto acima é capítulo do livro “SUS encontra NHS – o dia em que o Sistema Único de Saúde acordou com as tecnologias de informação britânicas” – com lançamento nacional previsto para março de 2015. A sequência do artigo estará disponível no site do EMI tão logo o livro seja publicado. Agradecemos a compreensão.
